Padre Wenceslau Szuniewicz, o Padre Doutor

Waclaw ou Wenceslau nasceu na cidadezinha de Glenbokie, na diocese de Wilno, aos 28 de dezembro de 1892. Seu pai, Romualdo Szuniewicz, era artesão e a mãe Paulina Cybulska, dona de casa. Para os estudos superiores, Wenceslau dirigiu-se para Moscou, onde frequentou as aulas na Faculdade de Medicina. Formou-se em 1917. Como era tempo de guerra, a I Guerra Mundial, ele foi convocado para servir o exército russo. No front de Minsk passou meio ano e, em seguida, em Tul e Voronec trabalhou nos hospitais militares e governamentais.
Sempre se apresentava como polonês e por ocasião da repatriação, conseguiu sem dificuldade o direito de regressar à Polônia ressuscitada. Exerceu a sua missão nos hospitais de Wilno e dava aulas na Universidade Stefan Batory, Departamento de Pediatria e de Oftalmologia.
Descobriu sua vocação vicentina ao perceber o trabalho devotado e desinteressado das Filhas da Caridade no hospital de Wilno. Deixou o hospital e a Universidade, e ingressou na Congregação da Missão, a 24 de abril de 1927, em Stradom Cracóvia, sendo admitido no Seminário Interno. Foi no dia da Natividade de Nossa Senhora, 8 de setembro de 1930, que ele recebeu a ordenação presbiteral. Destinado com o segundo grupo de missionários poloneses foi as missões na China em 1931.


Na China, recebeu o nome chinês “Suen Wei Jen”, que significa homem de barba prateada, devido à cor dos seus cabelos brancos. Isso era um título honroso, de respeito para com o doutor. Lá ele exerceu as funções de padre e doutor, com a missão, como ele dizia, “de tratar o espírito invisível e ajudar o povo a recuperar a vista e a saúde”. Fixou a residência em Shuntehfu, província de Hopeh, norte da China. Iniciou os trabalhos numa pequena clínica com 19 leitos. Shuntehfu era uma cidade com cerca de 80 mil habitantes.
Com o tempo, o Pe. Szuniewicz construiu um hospital oftalmológico com 100 leitos, e 18 clínicas na província de Hopeh, distantes 30 a 70 quilômetros, aonde ele se dirigia de bicicleta. A sua atividade era muito intensa, realizando até 35 cirurgias de olho por dia, incluindo cerca de 800 extrações de catarata por ano. Anualmente, examinava 145 mil pacientes com problemas de vista, sendo o tracoma a praga da China. Além desses pacientes com problemas visuais, ele não deixava de ocupar-se também com os cuidados médicos das crianças.
O seu trabalho não se limitava apenas nesta província. O Delegado Apostólico Dom Zanin convidou o Pe. Szuniewicz para ir a Pequim e organizar o Departamento Oftalmológico da Universidade Católica e do seu Centro Hospitalar (1938).
Em 1936, o hospital de Shunteh recebeu a visita do Pe. Germain, SJ., Presidente da Universidade Aurora. No Boletim da Universidade, este escreveu em seguida que “a fama do cientista polonês” alcançou todas as províncias do norte da China. Pacientes chegam de centenas de quilômetros para se tratar com ele.


Com a chegada e ocupação dos exércitos comunistas, a missão foi fechada pelas novas autoridades e Dr. Szuniewicz continuou ainda os seus trabalhos médicos em outros lugares. Aconselhado pelo Bispo, decidiu então ir aos Estados Unidos a fim de aperfeiçoar-se ainda mais na tecnologia oftalmológica e a 6 de fevereiro de 1949 recebeu o visto americano.
Nos Estados Unidos, inicialmente o Pe. Szuniewicz esteve em Derby, em seguida, no mês de outubro de 1949 mudou-se para New Haven, por ser mais próximo da Universidade de Yale. Residia com os co-irmãos em New Haven e fazia as suas pesquisas nos Laboratórios da Universidade. Ele proferia também palestras sobre as suas experiências oftalmológicas na China. O seu supervisor científico foi Francis Paul Guida (1909-1981). As suas experiências e dois manuscritos preparados para a publicação, um em janeiro de 1952 e outro, em setembro de 1954, por razões desconhecidas nunca foram publicadas.
No entanto, os seus esforços e pesquisas foram relembradas, graças ao Prof. Dr. Rocko M. Fasanella, M. D. oftalmologista de New Haven. Dr. Fasanella escreveu que “o Pe. Szuniewicz era uma das pessoas mais admiráveis que encontrei. Era um santo em vida. O seu conhecimento médico era muito moderno apesar de estar longe das instituições durante anos. Os seus estudos de laboratório sobre a cirurgia da córnea de 1951 nunca foram publicados, no entanto foram apresentadas dissertações públicas. Esses estudos foram repetidos independentemente na Europa em 1976 e avaliados em 100% corretos. Ele foi um excelente professor em todos os sentidos”.
Segundo Dr. Fasanella, “o Pe. Szuniewicz foi um médico qualificado com vasta experiência em oftalmologia e grande pesquisador no campo da cirurgia da córnea. O conceito da correção cirúrgica do astigmatismo da córnea, o Pe. Szuniewicz provavelmente começou em Shuntehfu, no ano de 1946, época em que ele não tinha acesso com a literatura oftalmológica, durante 21 anos. Pensamos que é a coisa certa afirmar que as suas idéias eram originais e apareceram independentemente e, que as suas pesquisas não eram simplesmente um trabalho repetido feito por outros”.
Ainda nos Estados Unidos, recebeu a proposta do governo americano de se naturalizar. Preferiu vir para o Brasil. Permaneceu um mês em Curitiba, estudando o português e logo foi destinado para Mafra. Em 1956, foi transferido para Irati, Paróquia São Miguel, onde era pároco superior o Pe. Sigismundo Piotrowski. Este deixou-lhe a liberdade de atuar na sua missão sacerdotal e profissão de médico. Travou conhecimento e grande amizade com os médicos. Promoveu encontros e reuniões com os mesmos visando um melhor aparelhamento do hospital. Fundou um ambulatório médico no bairro Rio Bonito, o mais populoso e mais pobre da cidade. Conseguiu a colaboração de alguns médicos, no sentido de dar uma maior assistência médica aos pobres. Tornou-se capelão do hospital dirigido pelas Filhas da Caridade e procurou orientar os enfermeiros na sua profissão. Prestava serviço espiritual aos doentes, enfermeiros e médicos. Fazia cirurgias principalmente na sua especialidade em oftalmologia, e em outras intervenções cirúrgicas como médico assistente.
Amava e admirava muito os jovens. Por isso, deu vida nova às associações existentes e fundou novas, visando sempre a promoção humana integral. O povo o chamava e até hoje o chama de Padre Doutor.
Idealizou um movimento com o nome de “Associação dos Pais Cristãos”, que seria como que a coluna vertebral de toda a sua atividade e como a sua última obra prima que persistirá por anos afora. A Associação desenvolveu-se rapidamente e conseguiu a declaração de “Benemérita Associação de Utilidade Pública Municipal”.
Entre as obras da Associação merece destaque o ambulatório médico e dispensário do Rio Bonito e a Biblioteca Volante Coletiva. A Biblioteca chegou a contar com cerca de 17 mil volumes.
Tendo dominado bem a língua portuguesa, Pe. Szuniewicz coloca os seus talentos e colaborou com artigos de fundo pedagógico e religioso no jornal local “O Debate”. Publicou, frequentemente, folhetos populares com o intuito de orientar e esclarecer os leitores a respeito dos problemas religiosos e morais. Movimenta também os jovens com apresentação de peças teatrais.


Conhecendo a língua inglesa, entra em contato com a Caritas dos E.U. e traz benefícios em alimentos, remédios e roupa tanto para Associação dos Pais Cristãos, como para o Hospital de Caridade e para os pobres dos bairros.
Como podemos ver, o Pe. Wenceslau foi um homem de uma intensa atividade médico-pastoral e incansável na sua doação pelos outros; homem de grandes talentos naturais e desenvolvidos graças à sua persistência, de uma retidão sem precedentes, coroado de humildade e simplicidade verdadeiramente evangélicas e vicentinas. Deixou na China uma obra incalculável de méritos como sacerdote e como médico, além da organização de alguns hospitais e dispensários, preparou chinesas para assumir e continuar esta obra de beneficência para os pobres necessitados.
Sempre muito atencioso e delicado, atraía a atenção, a confiança e amizade de todos, tanto adultos como jovens e crianças, tanto dos pobres como dos ricos.
No mês de outubro, sentindo-se um pouco mais fraco e indisposto, apesar de tomar algumas providências, eis que no dia 16 de outubro de 1963, ‘de manhã cedo’, em que costumava celebrar a Missa, um ataque cardíaco o vitimou
A notícia se espalhou de repente por toda a cidade, com choro e constrangimento principalmente da parte dos pobres que perdiam o seu pai e benfeitor. Centenas e milhares de pessoas, tomando conhecimento, queriam prestar a sua última homenagem pelo bem recebido durante a sua vida.
Em 2019, um livro de sua biografia foi lançado por Herculano Batista Neto intitulado “O Genial Padre Doutor”. Neste mesmo ano o governo polonês fez uma Condecoração Póstuma ao Padre Wenceslau concedendo-lhe a Medalha da República da Polônia. Na sequência dos eventos mais dados foram coletados para que o processo pedindo sua beatificação pudesse chegar a Roma. A comunidade católica aguarda com esperança que que ele seja elevado à santificação. Neste ano de 2021, o padre Lourenço Biernaski também publicou livro sobre o Padre Wenceslau intitulado “Wenceslau Szuniewicz, Médico e Padre e Sua Aventura Humano-Missionária”. Por tudo isso e por sua genialidade, a admiração pela sua biografia o faz tão querido e respeitado.

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