Heverton Gil, o campeão mundial de parajiu-jitsu

Esther Kremer

Aos 25 anos, Heverton Gil é campeão mundial na modalidade de parajiu-jitsu e, em entrevista exclusiva para o Jornal Folha de Irati, ele contou mais sobre a sua história e a trajetória para se tornar um campeão tanto no esporte, quanto na vida.


Heverton nasceu com uma deficiência congênita que afetou os membros inferiores. E conta que nasceu prematuro, com apenas seis meses, o que afetou a parte motora das pernas, assim como o equilíbrio e amplitude de movimentos. “Como eu nasci de seis meses, o médico falou para a minha mãe ‘mamãe, vai para casa e arruma o caixãozinho do seu filho, porque ele não vai sobreviver’, mas eu estou aqui e o máximo que Deus permitiu que acontecesse comigo foi perder parte dos meus movimentos e eu estou aqui para reescrever a história”, comenta.


O amor pelo esporte
Foi durante a infância que Heverton viu o esporte como uma válvula de escape, onde ele poderia brincar e se divertir como qualquer outra criança. “Brincar de pega-pega era difícil, eu tinha mais dificuldade e foi no esporte que encontrei uma forma de me sentir mais incluso”, disse.


Legenda: Na foto, Heverton, a mulher Gracielle e filho Pedro Gabriel – Foto: Esther Kremer

O esporte, pela característica forte da inclusão, fez com que o paratleta pudesse se sentir ainda mais parte de um grupo. Na fase da adolescência, teve contato com a modalidade do atletismo, na escola, onde foi incentivado pelos professores de Educação Física, Emerson e Eliton, e conseguiu se tornar campeão dos Jogos Escolares com o atletismo. Após as conquistas no atletismo, ainda na escola, Heverton recebeu um convite para morar em Curitiba e competir de forma profissional.


Em Curitiba
“Cheguei na capital para competir pelo atletismo, o clube que me chamou tinha me prometido mundos e fundos. Cinco meses antes eu fui até lá para acertar os detalhes e quando fui para morar de fato, tudo era diferente, a bolsa que eles me prometeram não existiu, o clube que me contratou teve que me emprestar para outro clube e, mais uma vez, eu precisei me superar”, explica.


Heverton comenta que morou por oito anos em Curitiba e que no primeiro momento a mãe esteve ao seu lado, tudo para buscar um grande sonho, o de poder viver do esporte e se tornar um grande campeão. “Teve um dia em que eu estava deitado no colo da minha mãe, chorando muito, e falava para ela ‘todo mundo da minha idade já está encaminhado com alguma coisa e eu estou aqui, buscando um sonho e nada está dando certo’. Minha mãe sempre dizia para ter calma, porque Deus estava preparando tudo na minha vida”.


A vida no jiu-jitsu surgiu quando Heverton ainda estava em Curitiba e emprestado para outro clube no atletismo, buscando melhorar o condicionamento físico em uma academia e se deparou com pessoas praticando o esporte. “Eu sempre aprecei o mundo das lutas, mas, na minha cabeça, as lutas começavam em pé e eu seria mais um telespectador. Quando eu vi o jiu-jitsu e senti que dava certo para mim, peguei o contato e conversei com o professor”, disse.


Legenda: O paratleta durante competição do mundial No-Gi, em São Paulo – Foto: Reprodução

A oportunidade de começar a competir no parajiu-jitsu surgiu em 2018, mas, segundo Heverton, ele não conseguiu grandes êxitos. “Só batia na trave”. A primeira medalha chegou em 2021, após Heverton ter se casado com Gracielle Ferreira Gil, e comenta que neste período ainda não se sentia um atleta profissional devido a vida que levava, onde cuidava pouco do próprio corpo e não mantinha uma disciplina.


O primeiro título internacional também chegou no de 2021, o South American Pro (parajiu-jitsu). “Eu ganhei estes dois títulos e achei que seria o meu ano, mas, algumas coisas aconteceram e eu não entendi o porquê, mas, agora, com esse 2023 mágico, eu entendo”, diz Heverton.


A vida na capital
Apesar de 2021 ter sido um ano de duas grandes conquistas, as dificuldades chegaram com força na vida do paratleta. Heverton diz ter sentido o mundo desabar sobre ele e a esposa. “Eu abri mão de um processo evolutivo da minha carreira para cuidar da minha família. A minha esposa, Gracielle, sempre teve o sonho de ser mãe, porém, várias vezes os médicos falaram que ela tinha apenas 1% de chances de engravidar e todos os meses tínhamos uma expectativa. Em 2021, a gente recebeu a melhor notícia das nossas vidas, tinha dado certo. Mas a nossa felicidade durou apenas 11 semanas, acabamos perdendo o primeiro bebê”, conta.


Ele conta que devido a esta enorme perda, precisou se afastar das competições. Quando conseguiu voltar para o esporte, uma lesão fez com que tivesse que parar novamente e aliado a todo o sofrimento, as dificuldades financeiras chegaram. “Estávamos apenas eu e ela, os nossos familiares nos ajudavam e nos mandavam dinheiro, mas chegou ao ponto de termos apenas um único pacote de macarrão na dispensa e ali eu percebi que as coisas estavam difíceis”.


O momento em que tudo começou a dar certo, foi quando o casal descobriu uma nova gravidez e as coisas começaram a evoluir. “Minha mulher chama essa fase de renascimento, a chegada do Pedro Gabriel. Ele nos levantou de uma forma inexplicável e nós temos motivos novamente para orgulhar ele”, explica.
Com a descoberta da gravidez, Heverton precisou voltar para Irati e, ao invés de ainda mais dificuldades, ele recebeu muito apoio e parcerias. “Isso nunca aconteceu na capital, Irati me surpreendeu de uma forma muito positiva”, conta.


Foto: Reprodução

Colecionando títulos
Com apenas 25 anos, Heverton coleciona diversos títulos, sendo: campeonato paranaense, brasileiro, sul-americano, South American Pro, pan-americano e o tão sonhado mundial.

Mas, segundo o mesmo, não é hora de parar. “Minha esposa sempre diz que eu não tenho noção do que estou fazendo e eu realmente não tenho, porque eu sempre quero mais, quero ganhar mais”, afirma.

“O máximo que Deus permitiu que acontecesse comigo foi perder parte dos meus movimentos, e eu estou aqui para reescrever a história”

Heverton Gil


Em novembro, Heverton terá mais um desafio pela frente, o campeonato mundial No-Gi com quimono, visto que esta medalha que ostenta de campeão mundial é na modalidade sem quimono. “Estou trabalhando nisso, treinando bastante e vou em busca de mais um título. Vamos seguir juntos para colocar Irati cada vez mais no topo do parajiu-jitsu”.


Heverton é um campeão mundial e um exemplo de resiliência e sucesso. A história nos lembra que, independentemente das adversidades que enfrentamos, podemos alcançar grandes conquistas quando acreditamos em nosso potencial e trabalhamos incansavelmente para realizá-las. Heverton Gil é um verdadeiro orgulho para Irati e para o Brasil, e as conquistas no mundo do esporte e da inspiração estão apenas começando.

Foto: Esther Kremer

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